REVISTA DIGITAL

Guanambi . Bahia .
Você está aqui: Capa » Plantão de Notícias » Arquivo de Notícias » Tempo de união dos continentes controlou a geologia das margens após a ruptura

Tempo de união dos continentes controlou a geologia das margens após a ruptura

Crédito: Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas

Crédito: Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas

No Hemisfério Sul, a abertura que separou a América do Sul da África ocorreu após um período de mais de 300 milhões de anos em que esses continentais estiveram juntos, enquanto, no Atlântico Norte, esse período de união continental que antecedeu à ruptura foi de aproximadamente 35 milhões de anos, resultando na separação entre a Groelândia e a Europa. O tempo transcorrido em que os continentes estiveram unidos – também conhecido como quiescência tectônica – pode explicar como as margens continentais evoluíram e como elas se diferem

O mapa do mundo não teve sempre a configuração que é conhecida hoje. Há cerca de 200 milhões de anos, havia apenas um supercontinente, chamado Pangeia. Após ele ter se fragmentado, 130 milhões de anos atrás, houve a divisão em Laurásia (América do Norte e Eurásia) e Gondwana (América do Sul, África, Índia, Austrália e Antártida). Na sequência, há cerca de 80 milhões de anos, ocorreu a separação entre a América do Norte e Eurásia e entre a América do Sul, África, Oceania e Índia, que se tornou uma ilha no oceano Índico. Depois, a Índia se juntou à Eurásia, após se colidirem.

Esta colisão, entre Índia e Eurásia, resultou na cadeia de montanhas dos Himalayas, popularizada por conta do monte Evereste, o mais alto do planeta. A dança dos continentes ocorre ao longo de toda a história da Terra, mas faltava estudar a influência da duração do período de quiescência (quando as placas tectônicas estão paradas) antes do rifteamento, que é quando a litosfera (a camada mais rígida e externa da Terra, formada pela crosta e parte do manto terrestre) sofre uma ruptura e, a partir disso, os continentes se separam e margens continentais são formadas, dentre as quais, se forma uma bacia oceânica (hoje, o Oceano Atlântico).

 

Foi então que, em artigo publicado em 2023 na revista científica Tectonics, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) estudaram os efeitos da quiescência tectônica entre a orogenia (os processos geológicos que resultam na formação de uma cadeia de montanhas) e o rifteamento, que é quando há a ruptura continental. O período que antecede à movimentação dos continentes, conhecido como quiescência tectônica, explica como se dá a estrutura das margens e como elas se diferem.

O geofísico Victor Sacek, pesquisador e docente do Departamento de Geofísica do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP) e um dos autores do estudo, explica que, ao observar o mapa do mundo, é notório o encaixe quase perfeito entre os litorais leste da América do Sul e oeste da África. “Na dança dos continentes, o que ocorre é que muitas vezes nós temos essa colisão dos continentes e, centenas de milhões de anos depois, ocorre a separação desses blocos continentais e formam-se margens continentais como nós temos ao longo da costa do Brasil e a margem conjugada africana”, exemplifica.

O pesquisador explica que, no momento de quietude, quando os continentes estão unidos, a crosta fica “cozinhando”. Isso ocorre pois, devido a alta concentração de elementos radioativos naturais na crosta, como Urânio, Tório e Potássio, a região de crosta espessada nas cordilheiras faz a crosta ficar mais quente com o passar dos milhões de anos. Nesse processo, a litosfera pode tornar-se mais frágil e suscetível à ruptura. Quanto maior é o tempo de cozimento, durante a quiescência, maior será a fragilização da litosfera, afetando a forma das margens continentais e como elas transicionam para a porção oceânica. “O tempo em que a crosta fica cozinhando, afeta a forma com que as margens vão evoluir”, afirma Sacek.

Entre Santos e Benguela

Neste estudo, os autores avaliam dois sistemas naturais que evoluíram a partir de uma fase de orogenia, passando por um período de quiescência tectônica, seguido pelo rifteamento. O primeiro exemplo é retratado nas margens continentais do Atlântico Norte, entre o leste da Groenlândia e o noroeste da Escócia. O intervalo de tempo entre o fim do colapso orogênico e o início do rifteamento (ou seja, o colapso tectônico/quiescência) no Atlântico Norte é de 30 a 40 milhões de anos. Passando para o segundo exemplo, do Atlântico Centro-Sul, mais precisamente na estrutura crustal que foi separada, nas margens do leste do Brasil (Bacia de Santos) e na África Ocidental (Bacia de Benguela, em Angola), o período de quiescência tectônica supera os 300 milhões de anos

Na Bacia de Santos, na costa de São Paulo, a margem continental (porção continental mais afinada que está principalmente submersa) é larga, ultrapassando os 500 quilômetros de largura, enquanto a margem conjugada na África, na Bacia de Benguela, é mais curta, com aproximadamente 100 quilômetros. “Os cenários numéricos que apresentamos, apesar de serem completamente computacionais, reproduzem a física da evolução dessas margens no tempo geológico e são coerentes com essas arquiteturas das margens nessas duas porções do Atlântico”, ressalta Sacek. Portanto, complementa o geofísico, enquanto no Atlântico Sul o tempo de quietude foi muito longo e capaz de criar essas margens bem assimétricas, no Atlântico Norte, por conta do período curto, reproduz essas feições de margens mais simétricas, ou seja, os dois lados têm margens mais ou menos de mesma largura.

Por que é importante estudar a formação das margens

A crosta terrestre, que é a camada mais superficial do planeta Terra, é formada por rochas, minerais e solo, além de servir como substrato para as atividades humanas. Por sua vez, o estudo das margens das placas litosféricas é muito relevante do ponto de vista geológico, pois, a partir disso, é possível observar como se molda a superfície da terra.

Como exemplo, para se saber onde é mais provável encontrar hidrocarbonetos, depende da evolução das margens. “A forma como se deu a evolução da margem é um indicativo importante para se saber onde encontrar petróleo. Outros fatores são se há uma camada selante e temperatura ideal no interior da Terra para as bacias sedimentares”, conta Sacek.

O artigo, que também é assinado pelo professor e pesquisador Claudio Alejandro Salazar Mora do IGc-USP, integra o projeto “Modelagem numérica geodinâmica do Sistema de Rifte do Atlântico Sul: implicações para a evolução Neoproterozoica do Orógeno Araçuaí e dos cratons São Francisco e Congo”, com fomento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Grants Numbers: 2017/24870-5, 2017/10467-4. O estudo também é financiado pela Petrobrás: Grant Number: 2017/00461-9. Os projetos envolvidos visam, a partir dos resultados obtidos, buscar a compreensão do comportamento da litosfera continental sob extensão durante a formação das bacias sedimentares de margem continental. Além disso, apresentar as implicações para a configuração da litosfera continental durante o Neoproterozoico e, consequentemente, para os modelos paleogeográficos do Supercontinente Gondwana.

Artigo científico

Salazar-Mora, C. A., & Sacek, V. (2023). Effects of tectonic quiescence between orogeny and rifting. Tectonics, 42, e2022TC007492. https://doi.org/10.1029/2022TC007492

Sobre o IAG/USP

O Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo é um dos principais polos de pesquisa do Brasil nas áreas de Ciências Exatas e da Terra. A missão é contribuir para o desenvolvimento do país, promovendo o ensino, a pesquisa e a difusão de conhecimentos sobre as ciências da Terra e do Universo e aspirando reconhecimento e liderança pela qualidade dos profissionais formados e pelo impacto da atuação científica e acadêmica.

Informações à Imprensa: SENSU Consultoria de Comunicação

Por: Moura Leite Netto

Comente esta matéria

O seu endereço de email não será publicado. Campos requeridos estão marcados *

*

Não serão publicados comentários com xingamentos e ofensas ou que incitem a intolerância ou o crime. Os comentários devem ser sobre o tema da matéria e sobre os comentários que surgirem. As mensagens que não atendam a essas normas serão deletadas. Os que transgredirem essas normas poderão ter interrompido seu acesso a este veículo.

Scroll To Top